Ajudar outras pessoas consola mãe deslocada em Moçambique

À medida que o deslocamento causado pela violência aumenta no norte de Moçambique, os civis afetados pela crise mostram resiliência e solidariedade frente à adversidade

Maria (em amarelo) com suas filhas e outros membros da família em um centro de trânsito em Pemba, Moçambique © ACNUR/Martim Gray Pereira

Maria teve que deixar sua casa duas vezes. Em março de 2020 ela escapou para a cidade costeira de Palma, após grupos não estatais atacarem seu vilarejo em Mocimboa da Praia, na região norte de Moçambique. Agora, um ano depois, ela foi forçada a fugir novamente e deixar tudo para trás após Palma ser atacada em 24 de março.


Mãe de três filhos, Maria estava trabalhando no campo, cuidando da fazenda de mandioca e arroz da família, quando seu marido ligou para dizer que a cidade estava sob ataque e que ela deveria pegar suas três filhas e fugir.

“Eu andei e nadei. Precisava garantir a segurança das crianças”, lembra. “Pude ver algumas pessoas tentando atravessar a água. Algumas não conseguiram. Foi terrível”.

Após cerca de 15 minutos, eles atravessaram a costa e viajaram por dois dias até chegar na cidade de Quitunga, 15 quilômetros ao sul de Palma, onde ficaram com parentes.

“Nós temos sorte de ter um teto sobre nossas cabeças e comida para as crianças, já que muitas famílias estão apenas dormindo na rua com nada”, afirmou. Desde que fugiu ela não tem notícias de seu marido e muito menos sabe de seu paradeiro, uma vez que todas as comunicações com Palma foram cortadas.

“Precisava garantir a segurança das crianças”

Após três dias em Quitunga, o som de tiros preencheu o ar – era hora de correr novamente. A família fugiu de bote, chegando no começo de abril em Pemba, capital da província de Cabo Delgado.

A maioria dos recém-chegados está hospedado com familiares e amigos, mas Maria, que não tem parentes em Pemba, está com cerca de outras 250 pessoas deslocadas à força em uma instalação esportiva. O local foi transformado pelo governo em centro de trânsito.

Desde 24 de março, mais de 19 mil pessoas fugiram de Palma para as cidades de Nangade, Mueda, Montepuez e Pemba. Estima-se que outras milhares foram deslocadas dentro do distrito de Palma. Quase 700 mil pessoas, principalmente mulheres, crianças e idosos estão internamente deslocados nas províncias de Cabo Delgado, Niassa, Nampula, Sofala e Zamésia. Elas escaparam da onda de ataques e violência causada por grupos armados não estatais que atuam na região desde outubro de 2017.

Maria (à esquerda) num centro de trânsito em Pemba para moçambicanos deslocados pelos ataques em Palma, província de Cabo Delgado

Maria (à esquerda) num centro de trânsito em Pemba para moçambicanos deslocados pelos ataques em Palma, província de Cabo Delgado © ACNUR / Martim Gray Pereira

O ACNUR, Agência da ONU para Refugiados, está providenciando serviços de proteção e itens de emergência como sacos de dormir e cobertores para todos os residentes no centro de trânsito. Também segue verificando os detalhes dos recém chegados e identificando as pessoas mais vulneráveis que precisam de assistência urgente.

Nas duas semanas em que esteve no centro de trânsito, Maria foi voluntária do ACNUR para ajudar a organizar discussões com os recém-chegados e explicar para outras mulheres a importância de medidas de prevenção à COVID-19 e à cólera. Ela também ajuda a identificar sobreviventes de violência de gênero e encaminhá-las para a assistência do ACNUR.

“Me sinto recompensada por fazer esse trabalho. Aprendi muito sobre o empoderamento das mulheres e como cuidar melhor de nós mesmas. Agora, eu quero compartilhar esse conhecimento com outras pessoas para que possam melhorar de vida”, explica.

Todas as manhãs, ela prepara baldes de água para as pessoas lavarem as mãos como parte das medidas de prevenção à COVID-19 . Ela diz que notou melhorias nas práticas de higiene entre a população deslocada e acredita que foram resultados das discussões em grupo e das sessões de treinamento.

“Não é fácil mudar o comportamento das pessoas, mas, aos poucos, mais mulheres e homens estão se preocupando com a higiene. É muito importante prevenir a propagação de doenças, especialmente em lugares lotados”, acrescenta.

Maria participou de um treinamento sobre prevenção de exploração e abuso sexual e ajuda a traduzir materiais de conscientização do inglês para o kimwani, a língua falada em Palma.

“Me sinto recompensada por fazer esse trabalho”

Margarida Loureiro, a chefe de escritório do ACNUR em Pemba, destaca o papel crítico que voluntários como Maria estão desempenhando.

“Por mais que trabalhemos para a comunidade, também trabalhamos com a comunidade. É fundamental para nós envolver os deslocados e as comunidades anfitriãs para compreendermos totalmente as suas necessidades”, explica.

Embora Maria seja atormentada por preocupações sobre a segurança de seu marido, ela está tentando ser forte pelas filhas de 5, 13 e 15 anos, que dizem sentir muitas saudades do pai. Ela não tem planos sobre o que fazer a seguir, mas sua prioridade é se reunir com o marido.

“Todos os dias, ao acordar, espero muito encontrá-lo na porta do centro de trânsito, em boas condições”, diz.

Por enquanto, ela está feliz por estar segura com suas meninas, que ela espera “um dia voltarão à escola e terão a chance de escolher seu futuro”.


Uma verdadeira tragédia humanitária está acontecendo em Moçambique! 

Quase 700.000 pessoas foram forçadas a deixar tudo para trás para escapar de ataques brutais de grupos armados. Mulheres e crianças são a maioria.

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