Bombardeios, minas terrestres e longas filas estão entre os riscos que os idosos enfrentam ao tentarem receber suas pensões.
Svetlana Shuko trabalhou por décadas na usina de carvão local, ganhando uma pensão que ela esperava que a amparasse durante a aposentadoria.
Agora, com o conflito armado que divide a Ucrânia, oito meses se passaram desde a última vez que a idosa de 78 anos recebeu algum dinheiro.
Vivendo com câncer e mal podendo deixar sua casa na devastada cidade de Starhonativka, é apenas graças aos vizinhos e à organização não governamental Proliska que a pensionista recebe ajuda.
“Quando meu marido estava vivo, eu não tinha medo”, diz Svetlana, puxando um cobertor em volta de si. Bombardeios têm devastado a área desde 2014 e são tão intensos que a despertam de seu sono durante a noite. “Agora eu me preocupo, pois se eu precisar me proteger no chão, nunca mais vou me levantar”.
“É muito difícil continuar”
Para receber sua aposentadoria, Svetlana precisa visitar um escritório na cidade a cada três meses para comprovar sua identidade e passar por procedimentos de verificação junto às autoridades estaduais enquanto deslocada interna.
Ela e o marido mudaram-se para Starhonativka há mais de 20 anos, mas nunca se registraram como residentes. Como resultado, o escritório da previdência a classifica como deslocada interna.
Ela acha a viagem até o escritório difícil por causa de sua saúde precária, por isso evita os ônibus superlotados e pega um táxi. “Eu vou no banco de trás, apoiada em travesseiros. É muito difícil continuar”.
Pegar um táxi custa 800 grívnia (US$ 30). Isso, além de sua medicação e custo de vida, deixa Svetlana com cerca de 1.700 grívnia (US$ 64) de aposentadoria, se ela receber o valor integralmente.
Svetlana é um dos quase um milhão de idosos deslocados internos que vivem no leste da Ucrânia e que lutam para receber suas aposentadorias. Muitos estão muito frágeis ou isolados para fazer a viagem de verificação. Para aqueles que o fazem, há a preocupação constante com bombardeios, minas terrestres e longas filas em temperaturas congelantes.
No posto de controle de Novotroitske, onde civis cruzam o território controlado pelo governo, um grupo de mulheres idosas está tremendo na neve. Elas estão esperando para receber suas pensões.
“Eu não recebo aposentadoria desde janeiro”, afirma Nelia, de 70 anos, da cidade de Dokuchaievsk. “Eu costumava trabalhar na pedreira. Agora eu não entendo porque não estou recebendo meu dinheiro. Eu passei duas horas esperando neste posto de controle”.
Savik, que tem 74 anos e é de Donetsk, passou dois dias esperando para ser atendido por funcionários do escritório da previdência de Volnovakha. Ontem à noite, ele dormiu em uma tenda aquecida na estação de trem para guardar seu lugar na fila. “Eu não entendo”, diz. “Nós merecemos essa pensão”.
“Eu não entendo. Nós merecemos essa pensão”.
Com uma doença terminal e sem os filhos, que fugiram para a Rússia depois do início do conflito, Svetlana está entre aqueles que dependem da Proliska, uma parceira do ACNUR, a Agência da ONU para Refugiados. A ONG ajuda Svetlana a receber tratamento médico, aquecer sua casa, cozinhar, limpar e garantir que ela seja atendida rapidamente no escritório da previdência, para que não precise suportar uma espera agonizante. No ano passado, a ONG, com outros parceiros, ajudou o ACNUR a fornecer assistência de inverno a 60 mil pessoas.
Contudo, a vida continua sendo um desafio para os idosos deslocados internos da Ucrânia.
A casa de Svetlana está situada em uma pequena colina com vista para a cidade. Neve ou chuva forte podem impossibilitar seu deslocamento. “Quando o tempo está seco, o carro chega até a casa”, diz.
“Quando o tempo está ruim, simplesmente não conseguimos ir. Há duas semanas, quando caí e quebrei o braço, a ambulância ficou presa na neve. Os médicos tiveram que caminhar”.
Embora os bombardeios encham Svetlana de medo e ela já esteja preocupada com o próximo mês – quando terá que renovar seu registro e viajar para outro sessão exaustivo de quimioterapia – é a morte de seu marido, há dois anos, que a deixa mais triste.
“Fomos casados por 56 anos. Nós nos conhecemos em Donetsk quando o primeiro Sputnik foi para o espaço. Eu saí na rua e ele me perguntou onde eu estava indo. Então, fomos ao parque para ver esse pequeno círculo no céu. Costumava ser tão bom, tão pacífico e quieto”. Ela suspira. “Eu nunca conseguirei substituí-lo”.
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